Noite de gigantes

De repente, eu estava sentado no sofá. Na mão, O Lobo da Estepe - o livro que era lido na Sociedade Literária do Escriba Cafe - na caixa de som estava tocando Bluebird, de Alexis Ffrench, que, com suas notas apressadas, formava uma calma melodia no piano, fazendo minha outra mão, que segurava um copo com Buchanan´s, mover-se lentamente, bailando a solitária pedra de gelo nos limites de seu mundo. Eu não estava dormindo, mas estava acordando.

Notei que nos braços do sofá havia diversos outros livros. Como chegaram até ali? Perguntei a Dostoievski se ele tinha alguma ideia do que estava acontecendo, mas ele estava ocupado demais flertando com valter hugo mãe, sim, sem letras maiúsculas no nome, assim como toda sua obra. A máquina de escrever do coitado deve ter quebrado a tecla de maiúsculas e, vivendo de palavras, ele não pôde consertar.

Herman Hesse estava firme em minha mão, olhando com certo desprezo para Kafka que era soterrado por Agatha Christie, George Orwell e Schopenhauer.

Havia somente um livro alheio aos demais que, ironicamente, certa vez, esteve cercado de vários outros na estante em festa, mas, agora, estava prestes a cair dali, como se nada mais importasse, e o simples fato de sua existência solitária o machucasse.

Mas eu salvei Goethe, com seu Werther, daquele terrível e iminente incidente.

Eu precisava lidar agora era com fato de que estava cercado por grandes homens e mulheres. Sua companhia se torna imponente quando os anos e histórias se somam em obras eternas que cruzaram fronteiras, eras e filosofias. Eu estava na companhia de imortais.

Naquele solitário início de noite eu me senti antagonizando multiplamente mundos paralelos. Por um breve momento não havia mais nada além daquilo. O astrônomo, no deserto do Atacama, mirava as estrelas e poderia facilmente ter me encontrado entre elas. A doutora cuidava de suas crianças naqueles dias finais de sua jornada e também olhou para o céu do sul, num breve e raro momento de seu turno, e, desapercebida, também pode ter me visto. O transeunte que se distraiu naquela noite, entristecido pelo fim de um amor, poderia ter me visto… mas o céu dele não tinha mais estrelas.

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